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“Todo laboratorista é fotógrafo”

- 04/02/2013

Laboratorista do Ipac e do jornal A Tarde, Josias Santos acompanhou o processo de informatização de uma redação de jornal e, por que não, o que mudou com o ostracismo da câmera analógica?

Maria Garcia

Foto de Crachá de Josias Santos no jornal A Tarde/ Reprodução

 

Josias Santos (48) possui uma rotina típica de um taxista: ouve o destino desejado pelo cliente, liga o taxímetro e roda pela cidade. Não há um número exato de atendimentos ou de quilômetros percorridos por dia. À primeira vista, não é todo mundo que percebe que aquele motorista designava outra profissão no passado, a de laboratorista. Com experiência no Instituto do Patrimônio Artístico Cultural da Bahia (Ipac) e no jornal A Tarde, ele recorda as diferentes rotinas de uma mesma atividade.

Trinta anos atrás começou a trabalhar como mensageiro no Ipac. Aderindo às constantes mudanças no seu ofício, subiu degraus na sua profissão. Foi em um laboratório que Josias conseguiu se enturmar e aprender a revelar o filme preto e branco: “Via a foto surgir no papel e aprendi a conservar filmes e revelações”. Dentro da pequena sala escura do instituto, conheceu o romantismo daquela atividade. Em sua opinião, todo laboratorista era também um fotógrafo, pois aquele profissional manuseava o ampliador, um tipo de câmera fotográfica com dispositivos e técnicas, para revelar com o mesmo cuidado que fotógrafo tinha no momento da captura.

Desaprendendo na redação. Na década de 90, quando começou a trabalhar em um dos mais importantes jornais impressos da Bahia, o jornal A Tarde, Josias “desaprendeu” o que tinha feito a vida inteira. Diferente do cuidado e da conservação, características importantes exercidas no seu trabalho no Ipac, a redação exigia rapidez e praticidade. “Quando cheguei no A Tarde, fiquei chocado com o que vivi. Não havia cuidado com o negativo, não tinha procedimento para conservar o material. E o arquivo acabou ficando terrível”, lembra.

A rotina de Josias no jornal não era nada simples. Seu trabalho tinha início no momento do fechamento da edição, o que significava momentos de euforia e agilidade. “O horário demandava um pouco mais de pique. Era necessário ter maior intimidade com o processo. No final, todo mundo ficava desesperado e quem vacilava se dava mal”, frisa o taxista. Junto a outros dois laboratoristas, companheiros de trabalho, Josias revelava as imagens que os fotógrafos produziam para o jornal.

Para identificar informações daquela imagem, os laboratoristas também tinham sua função: usavam um carimbo personalizado na parte de trás da fotografia, escrevendo o dia da tiragem, o nome do fotógrafo e o assunto. Em algumas situações, Josias também desempenhou a função de fotógrafo, e lembra que dentro dos laboratórios são formados muitos fotógrafos e editores de fotografia de uma redação de jornal.

Josias acompanhou de perto o processo de modernização sofrido pela editoria de fotografia do jornal A Tarde. O objetivo almejado era um processo mais prático de seleção e catalogação de fotografias. O ex-laboratorista lembra que em meados dos anos 2000, os laboratórios fecharam, após um determinado período, proibiram o uso de químicos, foi dado início ao uso do Photoshop e propuseram cursos de edição de imagens e catalogação digital, utilizados até hoje, para os profissionais ociosos. Aos poucos, os dias de trabalho tornaram-se diferentes. O laboratorista deixou de revelar e passou a colocar apenas os dados das fotos, como lente, abertura, dia e local. Anos depois, em 2005, Josias pediu sua demissão por motivos pessoais.

Para Josias, a evolução da fotografia analógica para a digital melhorou os rumos da fotografia. “Há, atualmente, a possibilidade de brincar mais com a própria imagem”, explica o atual taxista. No entanto, segundo Josias, não basta usufruir de uma máquina excelente. A pessoa precisa ter técnica e talento.

É justamente quando conversa sobre a fotografia digital, que Josias recorda da importante função do laboratorista na época da fotografia analógica. “Agora, com a câmera digital, você é mais independente. Antes, o corte da fotografia era feito pelo laboratorista”, explica. Ele também lembra que Sebastião Salgado, fotógrafo brasileiro famoso por suas fotografias expressivas e únicas, trabalhou durante muito tempo junto a um laboratorista francês. “Atrás de um grande fotógrafo, sempre havia um bom laboratorista”, recorda saudoso o ex-laboratorista.

* Com a justificativa de que “o lugar do fotógrafo é atrás das câmeras, não na frente dela”, Josias preferiu não ser fotografado

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