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O bê-a-bá do Alfa e Beto
- 06/04/2013Além de uma perspectiva engessada, o Programa Alfa e Beto (IAB) não oferece uma proposta de ensino que respeite a diversidade. O investimento total da prefeitura para adquirir os livros foi de R$ 12 milhões
Ana Paula Lima e Raquel Santana
Desde o início do ano letivo, a implantação do sistema de ensino do Instituto Alfa e Beto (IAB), gera polêmica entre os professores da Rede Municipal de Salvador. Segundo os educadores, o material contém textos racistas, sexistas e traz valores judaíco-cristãos. Eles alegam também que o conteúdo dos livros é descontextualizado em relação à realidade sociocultural dos alunos, além de focar apenas a decodificação de fonemas em letras e vice-versa, sem estimular a capacidade de interpretação das crianças.
Segundo a diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia (APLB), Jacilene Nascimento, responsável pelo acompanhamento das questões pedagógicas e étnico-raciais de todo material distribuído na rede municipal de ensino, os professores questionam o fato da prefeitura não tê-los consultado antes de comprar os kits, que pretendem alfabetizar os alunos até os 6 anos, dois a menos do que prevê o Pacto pela Alfabetização na Idade Certa, do Ministério da Educação. “Nós só conhecemos o projeto durante a jornada pedagógica”, alega.
Depois de uma série de protestos contra a implementação do método de ensino, o que inclui uma paralisação de 48 horas, no dia 20 de fevereiro, o secretário da Educação do município, João Carlos Barcelar, voltou atrás e tornou opcional a utilização do material. Com a decisão, os educadores já devolveram, segundo a Secretaria Municipal da Educação, 562 kits dos 3.780 distribuídos no início do ano. O investimento total da prefeitura para adquirir o material foi de R$ 12 milhões, em um convênio realizado por dispensa de licitação.
Para analisar os termos deste convênio e os possíveis prejuízos com a adoção de dois sistemas paralelos de ensino, o Ministério Público da Bahia entrou em cena. A promotora Rita Tourinho requereu, no dia 19 de fevereiro, à Secretaria da Educação, uma série de documentos para apreciar o contrato. “Além dos R$ 12 milhões pagos pelos kits de livros, o projeto propõe uma gratificação aos professores e coordenadores pedagógicos que participarem do programa. Os valores variam entre R$ 300,00 e R$ 900,00 e correspondem ao montante de R$ 14 milhões para este ano, sendo que o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) prevê a distribuição de livro gratuitamente e também inclui o repasse de verbas para professores e coordenadores pedagógicos”, destaca. A documentação está sendo analisada e, caso seja constatada alguma irregularidade, o MP pode pedir a anulação do convênio.
Polêmicas – A APLB questiona, ainda, o conteúdo do material por conter textos como “As bonecas de Fernanda”. Um dos trechos diz o seguinte: “Fernanda tem duas bonecas. Uma é linda de se ver. A outra, coitadinha, é feinha de doer. A bonita tem cabelo loiro, todo ele trançado. Quando se puxa uma corda, vira a cabecinha para o lado. A feia tem pouco cabelo, de tanto que já foi puxado. Não tem pilha, não tem corda, não se move para o lado”.
Sobre o texto, Jacilene é enfática: “A gente não aceita um material que especifica o estereótipo de beleza, em uma cidade como Salvador, como loiro, branco e do cabelo liso. A maioria das escolas que aceitou o método de ensino, é gerida por diretores nomeados pelo secretário e não eleitos pela comunidade”. A APLB deu entrada em um processo na Procuradoria Geral do Município (PGE) pedindo a retirada total do material das escolas.
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Mas afinal, que tipo de alfabetização é essa?