A febre dos NFTs: o que são e como movimentam o mundo por meio dos blockchains

Aline Alves e Catarina Oliveira - 01/06/2021

Os NFTs se popularizaram este ano com as vendas de memes e imagens por milhões de dólares.

Você com certeza já viu o velho e bom meme de uma garotinha que sorri em frente a um prédio queimando no fundo. Se por acaso não se lembrar, vamos mostrar agora.


Meme de garota em frente a um incêndio é vendido por US$ 473 mil 
Crédito: Reprodução/Site Foundation)

Você também pode já ter visto esta imagem abaixo em algum canto da internet. Esta é a obra digital do artista Beeple, “Everydays: The First 5.000 Days”.


Obra NFT de Beeple: “Everydays: The first 5000 days” (Imagem: Reprodução)

Você pode estar se perguntando por que estamos te mostrando essas duas imagens, mas elas têm um ponto em comum: um certificado de autenticação, que se popularizou nos últimos meses, mais conhecido como NFT. Sigla em inglês para token não fungível, o NFT é uma espécie de certificado de propriedade de um bem digital. Por meio da tecnologia de blockchain – sistema de registro de criptoativos, como os famosos bitcoins –  qualquer produto virtual pode se tornar propriedade de uma única pessoa e ser comercializado. O meme da garotinha, por exemplo, chegou a ser vendido recentemente por mais de 470 mil dólares. Já a arte digital, por quase 70 milhões.

Fonte: FAPESP

Com milhares de memes, imagens e até mesmo áudios sendo autenticados por meio das NFTs, há quem diga que esta autenticação será promissora para artistas, como explica a articuladora do Eupean Law Observatory em novas tecnologias, fundadora da Oxford Blockchain Foundation e membro da International Real Estate Blockchain Association, Tatiana Revoredo. “ Os NFTs permitem transacionarmos qualquer ativo não fungível em meio digital, seja um pedaço de um apartamento, ingressos de bandas, músicas e artes digitais, sem possibilidade de fraude e alcançando consumidores para além das plataformas em que o NFT foi criado”. 

Um novo futuro para a arte?

Que os nfts têm suas vantagens, nós já sabemos, mas uma discussão em torno do possível fortalecimento de uma arte cada vez mais artificial tem ganhado espaço. Recentemente, o ex-leiloeiro da Christie’s, casa de leilões britânica de belas artes, Charles Allsopp, disse à BBC que o conceito de comprar NFTs “não fazia sentido”. Segundo ele, a ideia de comprar algo que não está lá seria simplesmente estranha.

Outro fato que também chamou atenção ainda neste ano foi quando um grupo de entusiastas das NFTs adquiriu uma obra de Banksy por US$ 95.000 e a queimou em uma transmissão ao vivo no Twitter. Após a queima, o grupo comercializou a versão digital desta obra em uma NFT por mais de US$ 382.000. A operação dividiu opiniões no meio artístico. O crítico de arte britânico Ossian Ward disse também à BBC que avaliou o ato como uma ação de baixo valor artístico. Já a porta-voz do grupo que organizou a queima, Mirza Udin, afirmou que foi uma expressão da própria arte.

Obra de Banksy foi queimada em transmissão ao vivo (Foto: Reprodução/@BurntBanksy)

Assista abaixo ao vídeo da obra sendo queimada:

Segundo Grégori Castelhano, pesquisador do Laboratório de Pesquisa em Mídia Digital, Redes e Espaço, da Universidade Federal da Bahia (Lab404/UFBA), o mercado de arte especulativo sempre existiu e não é surpresa que estejam havendo grandes negociações em torno de obras de arte digitais. “O mercado de arte já é por muito tempo especulativo. A instituição artística precisava de autonomia em relação às outras instituições, mas, para isso, esse mercado necessitava de uma certa comercialização para sobreviver. É por volta  da década de 1970 que a moeda perde o lastro em ouro e, com o processo de financeirização, as obras de arte conquistam espaço e se tornam um grande mercado. Elas viram um meio de trocar dinheiro. O que estamos vivendo não é novo”.

Para uma profissão que não é muito valorizada, especialmente em tempos de crise como a que passamos com a pandemia do coronavírus, o fascínio por grandes quantias de dinheiro envolvidas nesse mercado tornam os NFTs bem difíceis de ignorar. No entanto, segundo Grégori, as especulações podem ficar restritas a um pequeno grupo de artistas e podem se transformar em uma bolha. Por isso, não seria possível contar que todo artista pode ficar rico da noite para o dia com uma certificação. “Com essa financeirização especulativa é interessante que você estoque o valor do dinheiro em algum bem. Eu acredito que o NFT vem nesse sentido de gente com muito dinheiro, muito bitcoin ou outras moedas digitais, investir. Hoje temos esse jogo de você conseguir estocar dinheiro em NFT, principalmente agora que ele também está começando a ser consagrado e institucionalizado”.

Impactos ambientais

O impacto que os NFTs trazem é algo novo: o consumo energético dos blockchains. O blockchain é o que garante a autenticidade do token, e, para funcionar, exige diversos cálculos complexos, que têm um gasto energético considerável. Quanto mais os NFTs se popularizarem, maior será esse gasto.

Segundo a Digieconomist, a pegada de carbono de uma transação com Ethereum – plataforma onde a maior parte das transações de blockchains ocorre –  é de 34 kg de dióxido de carbono, equivalente a mais de 5700 horas de vídeos assistidos no YouTube ou mais de 76 mil transações de cartão de crédito. Esse consumo de 70.32 kilo-watts/hora é suficiente para fornecer energia para uma casa nos Estados Unidos por dois dias e meio.

Para fungir um NFT no Ethereum, o custo energético é de 332 kilo-watts/hora; por ano, a plataforma consome mais energia que a Dinamarca e tem uma pegada de carbono semelhante ao da Lituânia. “A gente tem essa ideia muito errada que o que é digital é abstrato, não é palpável, mas de abstrato não tem nada. É material, são tecnologias que consomem recursos. No caso dos NFTs, que são dados, essencialmente, você consome água, carvão, petróleo, para que os datacenters e toda a estrutura necessária possa funcionar”, lembra Grégori.

Tatiana Revoredo, no entanto, afirma que, apesar dos dados alarmantes, não podemos tomar essas estimativas como uma verdade absoluta. Para ela, é preciso diferenciar o consumo energético da emissão de carbono. “O que polui o meio ambiente são as altas emissões de carbono, não o alto consumo de energia. O que não é sustentável e traz impacto ambiental são as fontes de energia não renováveis, e não o alto consumo de energia”. Um relatório recente da Coinshares, empresa de ativos digitais, aponta que 76% da energia utilizada para minerar bitcoins vem de fontes renováveis, de modo que este movimento consequentemente também tem chegado ao sistema de NFTs.

Revoredo sinaliza que as pessoas desconhecem que os NFTs fazem parte da indústria de criptoativos, pois roda em blockchain. Segunda ela,  há iniciativas na indústria cripto para reduzir impactos ambientais, como o Crypto Climate Accord, criado espelhando-se no acordo de Paris. 

Os signatários do Acordo Cripto Climático são participantes do mercado de criptografia que assumem o compromisso público de atingir emissões líquidas zero do consumo de eletricidade associado a todas as suas respectivas operações cripto-relacionadas até 2030. Além disso, esses apoiadores têm como tarefa relatar o progresso em direção à meta de emissões líquidas zero usando as melhores práticas da indústria. “Trata-se de uma iniciativa liderada pelo setor privado para toda a comunidade de criptomoedas e blockchain com foco na descarbonização da indústria de criptomoedas em tempo recorde”, complementa a especialista.

As controvérsias ainda são muitas, mas, sem dúvida, já podemos perceber o movimento da indústria de criptoativos para o uso de energias limpas e renováveis. Aliar sustentabilidade e progresso científico não é uma tarefa simples. Os NFTs apenas serão desperdiçados quando não utilizados de maneira inteligente, para melhorar os padrões de vida econômicos e sociais. Como concluiu Revoredo, tudo é energia e seu consumo e custo é subjetivo.

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