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Avós ou pais?

- 04/05/2016

Idosos assumem a responsabilidade de cuidar dos netos quando os pais não estão aptos

Caio Cruz e Daniele Marques | Foto Destaque: Mariana de Paula

“Só iria morar com a minha mãe se a minha avó fosse também”, afirma a pequena Maria Clara Gutierrez, 10. A garota, que está cursando o 5º ano do ensino fundamental, vive com a avó Juraci Barbosa da Silva, 64, o avô Reinaldo Matos da Silva, 69, e o irmão de 19 anos. Seus pais são separados e decidiram, em comum acordo, que os avós cuidariam deles.

Idosos responsáveis pelos netos são um fato cada vez mais comum no Brasil. Isso se reflete nos dados obtidos no último Censo, realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De acordo com a pesquisa, mais da metade dos idosos brasileiros são chefes de família. Como provedores da casa, eles também ajudam a criar e sustentar os netos.

Para Reinaldo da Silva, quem deveria cuidar dos filhos são os pais. “Minha parte eu já fiz”, afirma. Contudo, o aposentado recebe os netos de braços abertos. “Quando os pais se separam, sempre há brigas e situações chatas, então nesse caso o melhor para as crianças é ficar conosco”, pondera sua esposa, Juraci da Silva.

Benefícios e Malefícios

De acordo com o psicólogo Zé Diego, especialista em psicologia clínica, a convivência diária com os avós pode trazer muitos benefícios para ambos os lados. A troca entre diferentes gerações, para ele, é o principal. “Em uma relação bem estabelecida, um se enriquece com o outro. Por um lado, os netos aproveitam a experiência de vida dos avós e, por outro, os avós se nutrem da energia, da curiosidade e do vigor que são próprios da infância e da adolescência”, explica o psicólogo. Para ele, a troca de experiências e linguagens pode permitir transições importantes na vida dos avós, assim como a experiência dos idosos pode conferir às crianças a segurança para explorar esse mundo de hoje.

O músico André Dias, 30, ainda vive com os pais de sua mãe, que o criaram desde que nasceu. “Minha mãe sempre trabalhou e estudou muito, então minha avó que fez o papel de mãe”, conta. Para ele, o lado bom de ter sido criado dessa maneira é “o laço forte que eu tenho com os dois”.

Seu avô, Antônio Jonas Dias, 83, também enxerga um lado bom na história. “André cresceu em um ambiente doméstico recheado de relações familiares saudáveis, com todas as tias para conviver e educar. Nunca mudou nada o fato dele ser meu neto, assim como eu criei meus filhos, criei ele. Mas hoje é ele quem cuida da gente”, confessa. “Eu me sinto responsável por eles, cuidados médicos etc. Eu não me sinto assim em relação à minha mãe”, confirma o músico.

Entretanto, nem tudo são flores. Para Juraci da Silva, a adolescência é o período mais difícil para se educar. “É um momento onde eles questionam muitas coisas, estão se descobrindo e nós temos que saber lidar com isso”, explica. André também defende que este é o período mais complicado da relação.

“Os tempos mudam e meus avós são de outra geração, eles não tiveram acesso à educação formal, têm valores muito preestabelecidos, então às vezes minha avó e eu tínhamos embates por ela não me deixar sair. Se eu tivesse sido criado pela minha mãe isso seria mais fácil”, relata.

“Os pais educam e os avós deseducam”

É da sabedoria popular que os avós são, muitas vezes, os responsáveis pelos caprichos dos netos. Se o pai ou a mãe disse não, vovó e vovô dizem sim e os pequenos sabem disso. Mas quando os avós são os principais responsáveis pelas crianças, percebe-se que a situação é inversa. “Nunca mimei ele, pra mim na hora de educar tem que educar”, afirma o Vô Reinaldo.

O mesmo vale para a avó de Maria Clara. “Não existe mimar aqui em casa, eu tentei educar os meus netos, por exemplo, do mesmo jeito que eduquei o pai”, diz. Inclusive, segundo ela, a sua relação com os netos que não estão sobre seus cuidados é diferente. “Eu sou responsável pelos que moram comigo, então eu tomo as decisões. Já os outros, quem toma as decisões são os pais e eu não invado esse espaço”, conta.

Família Silva: a avó Juraci, a neta Maria Clara e o avô Reinaldo. Foto: Caio Cruz

Ouça o comentário do psicólogo Zé Diego sobre o entendimento popular de que os avós mimam os netos.

Perante a lei

Como em todas as relações familiares, nessa situação pode haver alguns entraves. Em alguns casos, os avós desejam interferir na criação dos netos e pedir a guarda dos mesmos, por exemplo. Mas, de acordo com a advogada Natana Gomes, enquanto os pais ainda possuem o poder familiar, ou seja, são responsáveis pelo sustento dos filhos, tais interferências têm que ser com o consentimento deles. “A exceção seria se o pai ou a mãe fosse incapaz mentalmente, por exemplo. Se os pais da criança forem menores de idade, os avós podem ter o poder familiar, mas apenas se o menor não se emancipar ou casar”, explica.

Outro ponto complicado, que pode causar prejuízos financeiros e psicológicos aos avós das crianças, é a Lei de Alimentos nº 5478/68, segundo a qual os parentes mais próximos dos pequenos — ou seja, os pais dos pais —, devem pagar a pensão alimentícia dos netos quando os progenitores não podem garantir a alimentação.

Porém, caso a criança não tenha outro parente que possa custear a pensão e um dos avós não consiga pagar o valor estipulado, mesmo que ele seja simbólico, a situação pode se agravar ao ponto de o idoso ou idosa ser preso. Foi o que aconteceu com a Dona Benedita Conceição dos Santos, 61, que foi detida pois não conseguiu pagar a pensão alimentícia dos netos. A matéria sobre este fato foi veiculada no Bom Dia Brasil.

LEIA MAIS

Reportagem da Empresa Brasil de Comunicação sobre avós que cuidam dos netos.

Matéria do Globo Repórter  sobre pais que se ausentam por um período, por motivos de trabalho, e os avós assumem a criação.

Matéria do G1 sobre idosa que ficou presa por dois dias após filho deixar de pagar pensão.

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