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Decadência do Pelourinho: mito ou verdade?

Laura Lorenzo e Luiza Leão - 22/11/2017

Comerciantes apontam crise econômica e sensação de insegurança como fatores que influenciam a visão de abandono do Centro Histórico

Inseguro, sucateado, pouco movimentado, abandonado. Será mesmo que o Pelourinho é tudo de negativo que andam dizendo? A equipe do ID 126 visitou o Centro Histórico para saber o que é mito e o que é verdade a respeito da fama do Pelô. Em conversa com comerciantes, fatores como falta de investimento e manutenção por parte dos órgãos públicos, a crise econômica mundial e o fechamento de três principais praças do Pelourinho foram os mais citados pela comunidade.

Localizado no Largo Terreiro de Jesus, restaurante Cantina da Lua é um dos mais tradicionais de Salvador (Foto: Laura Lorenzo)

Proprietário da tradicional Cantina Da Lua, que funciona há 70 anos no local, e atual presidente da Associação dos Comerciantes do Centro Histórico, Clarindo Silva afirmou que a situação é crítica para aqueles que têm negócios no Pelourinho. De acordo com ele, 186 estabelecimentos fecharam as portas nos últimos 10 anos e outros 99 correm o risco de seguir o mesmo destino devido a uma dívida de mais de R$ 30 milhões com Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC). “Com o pescoço na guilhotina”, avaliou Silva.

Um fator comum no discurso dos donos de estabelecimentos, funcionários, ambulantes e diversos membros da comunidade, quando questionados sobre a suposta decadência do Pelô, foi, predominantemente, a crise econômica. A proprietária de uma das lojas da Rua Maciel de Baixo, que preferiu não se identificar, foi categórica ao afirmar que o problema não é só o esvaziamento do Pelourinho, mas também a mudança do público. De acordo com ela, as pessoas podem até aparecer, mas a tendência é que não consumam mais como antes. “Depois dessa crise, em geral, não só aqui, mas em outros países também, a diminuição foi total. Tem dias que a gente vende e tem dias que a gente não vende nada. Em 2009, a gente poderia vender por dia R$ 2 mil. Hoje, para a gente vender R$ 100, tem que ralar muito”, explicou.

Prateleiras cheias: na falta de consumidores, produto se acumulam (Foto: Laura Lorenzo)

Vendedor do famoso suco de limão com coco, Milton Cavalcante tem ponto fixo no Pelourinho e afirma que os comerciantes têm percebido uma redução quase que pela metade do fluxo de consumidores no Centro Histórico. “O Pelourinho reduziu o movimento aqui no Centro de Salvador devido o que está acontecendo lá fora. E aqui no Pelourinho caiu um pouco, mas eu creio que se fizer mais investimento aqui no Pelourinho, melhora o movimento aqui. Reduziu 50% o movimento”, afirmou.

Insegurança

Um discurso comumente disseminado pelos soteropolitanos é de que o Pelourinho não é um lugar seguro. No entanto, os próprios trabalhadores locais discordam dessa ideia, uma vez que o policiamento foi reforçado, e comprovadamente percebido: hoje, há policiais praticamente em cada esquina.

Clarindo Silva defende que o Pelourinho não é violento (Foto: Luiza Leão)

“As pessoas continuam com um estigma de que o Pelourinho é violento. Quando falam isso eu fico muito angustiado. Como é que um bairro que tem um batalhão inteiro pela segurança, tem uma delegacia de proteção ao turismo, tem doze câmeras monitorando a área e é o único bairro de Salvador que você tem policiamento a pé durante 24 horas é perigoso? Você pode passar 22h aqui e não encontrar um civil, mas você vai encontrar um policial em cada esquina”, detalhou Silva, presidente da Associação dos Comerciantes do Centro Histórico.

Apesar de não terem se tornado raros, os assaltos diminuíram, mas a sensação de insegurança continua. “Um assalto no Pelourinho é um homicídio porque lá é uma área turística. Tudo ali repercute”, afirmou o Comandante Geral da Polícia Militar da Bahia, Coronel Anselmo Brandão, durante entrevista à Rádio Metrópole.

Um dos fatores bastante citados — e controversos — é o funcionamento do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) Gregório de Mattos, no Largo Terreiro de Jesus. Parte dos comerciantes acredita que por causa do centro, os usuários que são assistidos durante o dia, e que não têm para onde ir à noite, acabam se mantendo pelas ruas do Centro Histórico na madrugada afugentando visitantes por abordagens nem sempre amigáveis.

“As praças são o coração do Pelourinho. As pessoas vem às praças para curtir os eventos e depois elas se distribuem pelos restaurantes, pelas ruas. Com as praças fechadas reduz bastante o movimento”, explicou a garçonete Erivânia Ferreira.

Para o comandante da PM, o Pelourinho não precisa apenas de policiamento, mas de ajustes sociais. “Quem faz a segurança do bairro não é só a polícia, é a comunidade. E o entorno do Pelourinho tem sérios problemas, tem invasões, problemas sociais gravíssimos e até hoje, infelizmente, a gente, a sociedade, não conseguiu ainda diminuir aqueles conflitos”, acrescentou.

O problema dos assédios de usuários de drogas e moradores de rua é real, e a necessidade de uma política social também. Esse foi o ponto defendido por Clarindo. De acordo com ele, é preciso que o Pelourinho seja visto como o local cultural que é, mas também como um bairro, como qualquer outro de Salvador, que precisa ter seu povo cuidado. Segundo ele, o Caps no Pelourinho é necessário.

“Apesar de toda essa segurança, tem momentos em que a gente tem uma sensação de insegurança porque no Pelourinho não se anda 100 metros sem que ninguém nos aborde e queira nos vender alguma coisa ou pedir alguma coisa. Mas isso não é problema de polícia, isso é problema social”, acredita.

Praças fechadas

Fechados para reforma em maio deste ano, os largos Tereza Batista, Pedro Arcanjo e Quincas Berro D’agua, deveriam ter sido abertos em agosto, uma vez que o prazo para a finalização das intervenções, recomendadas pelo Ipac e pelo Corpo de Bombeiros, era de três meses. Para a comunidade do Pelô, os espaços têm feito falta.

Segundo a garçonete Erivânia Ferreira, da Cantina Da Lua, o problema da falta de atrações no Pelourinho, apesar de não ser novo, datado de cerca de 10 anos, foi agravado pelo fechamento das três principais praças, que ela definiu como “o coração do Pelourinho”. Sem esses espaços, shows, eventos e exposições deixaram de ser realizadas no Centro Histórico, o que fez com que o público, principalmente os soteropolitanos, deixassem de frequentar ainda mais das ruas do Pelô.

“As praças são o coração do Pelourinho. As pessoas vem às praças para curtir os eventos e depois elas se distribuem pelos restaurantes, pelas ruas. Com as praças fechadas reduz bastante o movimento”, explicou

Seis meses depois do fechamento das praças, o Governo do Estado, responsável pelas intervenções, ainda não anunciou uma data para a reabertura, limitando-se a descrever a obra como em “estágio final” e com previsão de entrega ao público em “poucas semanas”. Apesar disso, divulgou recentemente a abertura das inscrições de solicitações de pauta para grupos culturais interessados em se apresentar nos equipamentos. Pessoas físicas ou jurídicas interessadas em divulgar os projetos devem realizar a inscrição no site do Centro de Centro de Culturas Populares e Identitárias (CCPI) da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (Secult).

A Prefeitura de Salvador, por sua vez, retomou o projeto Pelourinho Dia e Noite, iniciativa que tem melhorado o movimento, por promover shows e outras manifestações artísticas no Centro Histórico, atraindo turistas e soteropolitanos. No entanto, a demanda trazida pelos eventos não é suficiente para recuperar o antigo público do Centro Histórico. Na opinião de Erivânia, o investimento mais intenso em atrações musicais, gastronômicas e artísticas é a saída para retomar os tempos áureos do Pelô. “Já têm surtido alguns efeitos bons, tanto para a Cantina da Lua, como para todo o entorno, né? Porque é algo que beneficia todo o Centro Histórico e a cidade como um todo. Porque o povo baiano não vem ao Pelourinho se não tiver eventos, então a gente tem que se apropriar daqui. Mas as pessoas não vem sem eventos, e não basta o turista vir. Então, é preciso que a gente venha, que a gente fale bem, que a gente queira vir”, disse.

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