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Parado no Ponto

- 25/11/2011
Uma viagem reveladora por três estações de transbordo em Salvador
Por Edely Gomes e Marina Teixeira

Linhas da Estação Mussurunga - Foto Edely Gomes

Sair de casa às 7h10 de uma terça-feira em Salvador pode parecer fora de propósito. Afinal de contas, a cidade praticamente para na hora do rush. Para os moradores dos bairros cujas avenidas desembocam na Paralela, por exemplo, é impossível chegar no horário se você esperar um ônibus a partir das 07 h.

 

Antes de chegar a Estação Mussurunga , paramos no bairro do Costa Azul. Para isso, tomamos um ônibus de tamanho menor – o chamado “minibus”, oficializado pelo Sindicato das Empresas de Transportes de Salvador (SETPS) – que era mais rápido e não parava em todos os pontos. Era 7h25.

O veículo saiu da Avenida São Rafael, atravessou o viaduto Dona Canô, seguiu em alta velocidade pela Pinto de Aguiar e chegou sem sobressaltos à Avenida Otávio Mangabeira. Seria o único momento em toda a viagem que não havia um forte tráfego. A partir da orla, foi necessária muita paciência e uma lista de músicas bem sortida no celular a fim de enfrentar as duas horas que se seguiriam. Chegamos ao Costa Azul às 9h da manhã.

Além da demora, o que mais incomoda os soteropolitanos que dependem do ônibus para ir e vir na cidade? “A insegurança, a sujeira nos veículos e a falta de educação”, disse Tatiane Barbosa, vendedora de acarajé que se encontrava na Estação Mussurunga esperando um ônibus para a Estação Pirajá.  O desempregado de Águas Claras Eduardo Almeida, que estava na fila dos ônibus que levavam à Lapa em Pirajá, adiciona outros elementos a essa matemática. “A superlotação e a dificuldade também no trânsito”. O policial militar Renildo Conceição, passageiro que encontramos na estação localizada no centro da cidade, declarou que por conta da sua profissão estar ligada à segurança, “há um risco em pegar ônibus”.

Estação Mussurunga - Foto Edely Gomes

Enfim, o destino final –  Depois do Costa Azul, tomamos um ônibus na orla em direção à Estação Mussurunga e chegamos ao local às 10h10. A movimentação não era grande; a estação encontrava-se esvaziada. Quinze minutos depois, o ônibus que queríamos chegou:  Estação Mussurunga – Estação Pirajá, via Paralela. O trajeto englobava também as Avenidas São Rafael e Gal Costa – este último um atalho bem grande para chegar ao segundo destino.

Todavia, duas surpresas desagradáveis apareceram: primeiro, um engarrafamento na São Rafael, num horário em que o lugar normalmente não está movimentado. Havia chovido na região.

Depois, a poucos minutos da Estação Pirajá, mais um engarrafamento. Porém chegamos. Não demorou muito até chegar a segunda condução, que levaria até o terceiro destino do dia.

Fila do ônibus na estação Pirajá - Foto Edely Gomes

Desta vez, a viagem não teve maiores dificuldades. No horário das 11h, a BR-324 e o Bonocô não estavam com grande quantidade de carros, e o ônibus se dirigiu em alta velocidade até o centro da cidade. Cansadas de tantas idas e vindas, só nos restou dormir e, entre um cochilo e outro, olhar através da janela para nos distrair com a paisagem enquanto mais um “DJ de buzú” embalava o trajeto com sua playlist selecionada.

Era meio-dia. Por termos feito a última parte do trajeto em horários mais tranquilos, não sentimos a dificuldade que normalmente ocorre na hora do rush – como no início da mnhã, quando saímos de casa. Mesmo assim, as pessoas entrevistadas não estavam satisfeitas com o transporte da cidade.

Qual seria a alternativa para um cidadão soteropolitano que precisa chegar em tempo hábil ao trabalho, à escola ou faculdade, que não fosse um ônibus?


“Onde a gente mora tem mototáxi; mas a gente não utiliza muito pra longe”, disse Eduardo Almeida, jovem desempregado de Águas Claras.  Já Tatiane Barbosa, vendedora de acarajé, diz “minha filha tem moto, mas eu particularmente ando mais de ônibus”.

Estação da Lapa - Foto Edely Gomes

Outras propostas– Governo estadual e prefeitura concordam que a solução para o desafogo do tráfego em Salvador é a adoção de um novo modelo de transporte. O metrô está a mais de 12 anos sem concluir; e se as obras forem completadas até 2012, apenas 6km serão contemplados com os vagões do metrô – entre a Rótula do Abacaxi e a Estação da Lapa. A segunda etapa – entre a Rótula e a Estação Pirajá –  não tem previsão de conclusão.

Já as alternativas recentemente colocadas em questão na mídia – o VLT (metrô de superfície) e o BRT (sigla em inglês de Bus Rapid Transit) não são de conhecimento de toda a população, mas os usuários de transporte público acreditam, como diz Eduardo Almeida, “quanto mais, melhor”. Segundo Tatiane, “as duas opções são boas, agora tem que ver as coisas acontecerem”.

A terceira opção ventilada pelos governos municipal e estadual é a construção de corredores cicloviários, ligando o Aeroporto à Rótula do Abacaxi. A ideia anima usuários do transporte alternativo, mesmo entre aqueles que não costumam passar pela região. Um deles é Ricardo Farias, estudante da Faculdade de Comunicação da UFBA (FACOM), que se locomove de bicicleta. “Diariamente, eu saio do Costa Azul e vou a Ondina; depois, da Orla eu vou ao Rio Vermelho; para o Teatro SESI, onde eu trabalho, e então retorno para o Costa Azul”, explica. Segundo o estudante, que está a três meses usando esse meio de transporte, as vantagens em relação ao carro e ao ônibus já são sentidas. “Você deixa o trânsito para trás, principalmente na hora do fluxo, 18 h. Você não se estressa tanto – apesar das ciclovias não estarem tão legais”.

Quanto aos perigos em andar de bicicleta no trânsito soteropolitano, Ricardo conta que no Rio Vermelho, “a gente não consegue pedalar pela calçada e tem que se meter entre os carros; além disso, os ônibus às vezes passam muito próximos”. A distância não é um empecilho para o rapaz, que declarou gastar 30 minutos de Costa Azul para Ondina e entre cinco e dez minutos de Ondina para o Rio Vermelho.

Porém, para os entrevistados das estações, a distância é um motivo primordial para a não-utilização de bicicletas para locomoção. Nem se houvessem corredores para bicicletas. “Muito longe mesmo”, disse Tiara Machado, também desempregada, na Estação Pirajá, ao ser questionada se iria de bicicleta de Cajazeiras até a Lapa. Eduardo completou com um categórico “e iria perder muito tempo”. Já Tatiane disse que não andaria de bicicleta na pista, porque “o trânsito é muito louco, há muita pressa. Só se houvesse uma ciclovia”. Renildo, o passageiro da Lapa, também rejeitou a ideia das bicicletas. “Bicicleta não, devido à falta de estrutura, não ter ciclovias, aí fica inviável”.

Ricardo acredita que ainda faltam ciclovias mais estruturadas na cidade. “Talvez ciclovias bem projetadas, pois muitas das que temos passam por pontos de ônibus que concentram muita gente. As pessoas também não estão acostumadas e passeiam pela ciclovia”.

Entre dúvidas, dificuldades e surpresas, circular por Salvador torna-se um desafio para pessoas de todos os bairros. As possibilidades apresentadas pelos governos podem sanar os problemas de trânsito da cidade, mas ainda não foram colocadas em prática. Enquanto as ideias não saem do papel,e ficam na dependência da Copa do Mundo, cabe aos usuários do sistema de transporte acordar mais cedo, fugir do horário de pico e tomar um ônibus lotado para chegar ao seu destino.

 

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