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Poesia divergente
- 14/08/2013Saraus tornam-se palco de ativismo sócio-racial e afirmação de identidade
Joana Oliveira e Thuanne Silva
Além de manter o papel de promover encontros sociais, alguns saraus contemporâneos tornaram-se palcos não apenas para a expressão de poetas e outros escritores, mas também para manifestações artísticas de caráter político. Esse é o caso do Sarau Bem Black, um dos pioneiros no circuito soteropolitano. Inspirado nos encontros poéticos do Cooperifa (SP), o evento acontece todas as quartas-feiras no Sanfoka African Bar, Pelourinho. Criado pelo coletivo Blackitude – Vozes Negras da Bahia, do qual o professor de Literatura da UCSal, escritor e ativista Nelson Maca é integrante, o sarau surgiu em 2009 e é um ponto de encontro da poesia divergente, trabalhando também as linguagens do hip hop.
“O coletivo Blackitude, que já existe há 14 anos, desenvolve muitos projetos com hip hop, poesia e audiovisual. A literatura sempre está presente em nossas ações”, explica Maca. O Bem Black surgiu com a premissa de ser um lugar em que as pessoas pudessem se encontrar, trocar textos, vender discos e divulgar livros. Artistas, ativistas, escritores e músicos são frequentadores assíduos do Bem Black. Muitos se tornam convidados ilustres e fazem participações especiais na festa. O rapper Gog, de Brasília, a cantora Ellen Oléria e os e baianos José Carlos Limeira, Jocélia Fonseca, Landê Onawlê, Hamilton Borges, Iara Nascimento e Giovane Sobrevivente são alguns que já marcaram presença no evento.
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Trecho do documentário Palavra – voz da periferia e da negritude, do qual participou o Sarau Bem Black
Sandro Sussuarana, 25, começou a escrever poesias após frequentar o Sarau Bem Black. Foi lá que o estudante de Serviço Social se inspirou para criar, junto com amigos, o Sarau da Onça, que, desde 2011, acontece quinzenalmente, no Centro de Pastoral Afro, no bairro de Sussuarana. A proposta é desenvolver um trabalho com os moradores do local, difundir a cultura e dar visibilidade aos grupos artísticos da própria comunidade que realizam apresentações de dança, teatro e música no evento.
Segundo ele, o sarau tem contribuído para a afirmação da identidade e aumento da autoestima de quem vive no bairro. “Antes, só se ouvia falar na violência e nas drogas em Sussuarana. Hoje, temos orgulho de falar do bairro, há a questão da identificação dos moradores, da identidade. É a questão da afirmação do existir. O importante é poder afirmar que se é sim, morador de Sussuarana, e não abaixar a cabeça”, comenta. Para ele, saraus como o da Onça e o Bem Black são “ao mesmo tempo lugares de descontração e de afirmação de identidade”.
O foco do evento são os jovens e o objetivo também é oferecer a possibilidade de mudança da realidade. “Quando um adolescente de 16 anos vê alguém da mesma idade fazendo poesia, ele se sente estimulado a fazer também. O sarau mostra para esses jovens que eles têm sim condições de fazer arte. Acredito que pode até funcionar para estimular o talento deles e servir como mudança da realidade em que vivem”.
*Créditos foto de destaque: Leo Ornelas
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