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Quadro de depressão é negligenciado no tratamento de idosos

- 04/05/2016

A questão é normalmente associada ao próprio envelhecimento em vez de ser observada pelo viés da saúde mental

Victória Libório | Foto destaque: Anciano Afligido (1890) por Vincent Van Gogh 

Hipertensão, diabetes, osteoporose, pneumonia ou infecção urinária são alguns dos tipos de complicações que o envelhecimento normalmente (e supostamente) traz para as pessoas. Entretanto, a noção de que a velhice equivale a problemas de saúde interfere na busca pela qualidade de vida e saúde plena. A falta de compreensão sobre si, e a suposição de que todo idoso passará por algum tipo de demência, tira a atenção sobre as questões de saúde mental.

Segundo a enfermeira Fábia Andrade, que pesquisa a contribuição da terapia comunitária em idosos pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), é normal que, na terceira idade, alguns indivíduos apresentem quadros psiquiátricos. Entre eles, estão a demência, estados depressivos ou psicose iniciados tardiamente.

“A depressão é uma das doenças que atingem frequentemente os idosos, potencializando a probabilidade do desenvolvimento de alguma incapacidade funcional”, afirma a pesquisadora. Ela alerta para os casos em que os estados depressivos não são percebidos e, consequentemente, não tratados. “Isso compromete intensamente a saúde do idoso, a ponto de acarretar aumento da mortalidade”, detalha.

A cada dia, aumenta o número de casos de idosos com quadro de depressão subestimado. A Organização Mundial da Saúde indica que a cada 100 idosos, pelo menos 15 apresentam depressão diagnosticada após os 65 anos de idade, sendo que 40% dos casos não são diagnosticados. No Brasil, com o total de 15 milhões de indivíduos, cerca de 2,25 milhões de pessoas com mais de 65 anos passam por essa situação, tornando-se, portanto, uma questão de saúde pública pouco observada. A Organização das Nações Unidas prevê que até 2030, a depressão será a doença mais comum do mundo.

Tratamento no escuro

Em 2006, o Brasil realizou a primeira Conferência Nacional de Direitos dos Idoso, que mapeou as deficiências do tratamento de depressão nos serviços públicos do país e apresentou um relatório sobre as condições de saúde mental dos brasileiros nessa faixa etária. Segundo o documento, cerca de 30% da população idosa apresenta algum transtorno mental, porém, “não se sabe se esses pacientes estão sendo atendidos por equipes multiprofissionais especializadas em psicogeriatria, com treinamento adequado para detecção e manejo desses transtornos”, afirma o relatório.

A conferência concluiu que são poucos os serviços com equipes especializadas, geralmente localizadas em hospitais-escola, e que não há estrutura adequada para receber idosos com transtornos mentais graves.

Cuidados especiais

O tratamento da depressão em idosos apresenta especificidades. A terapia medicamentosa, com uso de antidepressivos, deve ser avaliada cuidadosamente, já que “essas substâncias podem provocar efeitos adversos que prejudicam a adesão ao tratamento ou trazer riscos para o idoso”, explica a enfermeira.

Maria Ribeiro, 87, passou por um período de depressão há dois anos. As mudanças drásticas de seu estilo de vida contribuíram para uma sensação de impotência e frustração, o que culminou na doença. “Eu tive dificuldade em engolir o medicamento e o médico precisou colocar uma sonda em mim. Não sei há quanto tempo não sinto gosto de comida”, diz. A aposentada credita a depressão à sua condição de cadeirante.

“Eu sempre fui independente. Hoje, não consigo nem virar a cabeça sem ajuda”, relata. Maria apresenta uma atrofia muscular degenerativa que, sem intenso acompanhamento de fonoaudiologia e fisioterapia, deteriora profundamente as funções neurológica e motora.

Busca por saúde

Uma pesquisa realizada por profissionais de educação física e enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) reforçou a importância de um estilo de vida ativo para a prevenção de problemas de saúde mental. “A atividade física tem conseguido reduzir, ou atrasar, os riscos de demência, embora ainda não se possa afirmar que a evita completamente”, afirma Tânia Benedetti, umas das pesquisadoras do projeto.

Maria de Lourdes Carrilho, 94, trabalhou até os 88, quando teve um acidente vascular cerebral que paralisou o lado esquerdo de seu corpo. Ela, até hoje, mora com a irmã mais velha Iara, 97, que apresenta um grave caso de glaucoma e enxerga precariamente. Focada em sua recuperação, faz exercício todos os dias, mesmo quando a fisioterapeuta não vai à sua casa.

“Ultimamente, eu tenho tido acessos de raiva, ficando nervosa demais. Isso pra mim é perigoso por conta da pressão alta, então o médico me passou um remédio que tomo no café da manhã. Além disso, dependo do exercício físico, que é muito importante. Ele me acalma, controla minhas ansiedades”, conclui.

Lourdes Carrilho, 94, gosta da vida ativa e ainda se adapta às limitações fruto do AVC/Foto: Victória Libório

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