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Quando o direito passa despercebido
- 04/07/2012Conhecer as leis vigentes significa contribuir de forma ativa no processo de exercício da cidadania.
Aparecido Silva e Ruan Melo
Você sabia que pode solicitar, gratuitamente, à prefeitura os serviços de arquitetos e engenheiros? Já ouviu falar que microempresas e empresas de pequeno porte podem funcionar dentro de casa e não precisam, necessariamente, de uma sede? Não? Pois bem, acredite: você tem direito a tudo isso! Estas são apenas algumas das leis desconhecidas por parte dos cidadãos e que acabam tendo pouca aplicabilidade.
A Lei Municipal 4907, que está em vigor desde 1994, permite que microempresas e empresas de pequeno porte (aquelas que possuem até dois empregados) funcionem dentro das residências de seus donos. A falta de conhecimento deste direito, por exemplo, faz com que os pequenos empreendedores, que já começam com dificuldades enormes em um mercado competitivo como o atual, aluguem pontos comerciais caríssimos ou escritórios virtuais, quando eles poderiam economizar e tocar seu negócio dentro de sua própria casa.
Uma infração constantemente cometida por motoristas é dirigir apenas com uma mão ao volante. A multa para quem for flagrado nessa situação é de R$ 85,13 e perda de quatro pontos na carteira. No entanto, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê que o cidadão punido pode entrar com recurso alegando que estava trocando de marcha ou acionando acessórios do veículo. Nesse caso, a multa será convertida em simples advertência.
Foi visando alertar a população baiana para a existência de inúmeras leis que são “esquecidas”, que o gestor público e social Marcos Costa criou em maio de 2012 uma página no site de relacionamento Facebook. “O objetivo é envolver o cidadão nestas questões. Sinto que nós baianos temos a ideia de que só quem pode falar de leis é o ‘doutor’ (advogado)”, afirma o gestor. Ele conta que tudo começou quando, em uma reunião para implantação de uma oficina social em um bairro carente de Salvador, um professor que fazia parte do grupo comentou o não cumprimento de uma lei Federal sobre transporte escolar. “Ficamos indignados e daí surgiu a ideia de pesquisar mais leis e começar o movimento”.
Marcos movimenta seu perfil na Internet com a ajuda de quinze pessoas de diversas formações acadêmicas que estão envolvidas em questões sociais. O próximo passo do grupo é agendar uma reunião com representantes do Ministério Público para entregar um documento exigindo o cumprimento de algumas leis. Eles ainda pretendem criar um site sobre direitos ignorados pelas pessoas.
Educação – Segundo reportagem do Jornal O Globo de junho de 2011, no Brasil, de 2000 a 2010, foram criadas 75.517 leis, somando legislações ordinárias e complementares estaduais e federais, além de decretos federais. São 6.865 leis novas por ano – o que significa que foram criadas 18 leis a cada dia, desde 2000. “É bem verdade que existem, no Brasil, ‘leis que pegam’ e ‘leis de que não pegam’, o que revela o distanciamento que existe entre a intenção do legislador e a concretização das normas, através da conduta dos cidadãos e do próprio Estado”, explica o defensor público federal João Paulo Lordelo.
Para Lordelo, o desconhecimento dos direitos é o reflexo de um déficit educacional, somado a problemas de organização no sistema jurídico. “A ausência de uniformidade nas leis e nas próprias decisões do Poder Judiciário fazem com que o conhecimento sobre os direitos mais basilares seja um luxo para poucos interessados”, diz o defensor. Esta é a mesma opinião do vendedor ambulante Flávio Pereira, que também acredita que os órgãos municipais devem tornar públicas algumas informações. “Várias pessoas não reconhecem seus direitos. Acho que falta informação da população e divulgação da própria prefeitura, por exemplo”, argumenta.
No entanto, não basta apenas conhecer os seus direitos. “É preciso atentar ao fato de que o mero conhecimento dos direitos é apenas o primeiro passo. A concretização deles é o maior desafio, já que leva em consideração os seus custos e o orçamento público, numa relação bastante delicada”, alerta Lordelo.
Marcos Costa acredita que por se tratar de leis que dão direitos aos cidadãos, elas são marginalizadas ou “esquecidas” pelo Poder Público propositalmente. “O sistema inteiro trabalha neste propósito: ‘o governo é blindado e o poder do capital intocável’. Quantas são as causas na justiça contra o poder público que geram decisões favoráveis ao povo?”, questiona o gestor.
Já para João Paulo Lordelo, alguns direitos são restringidos de propósito, para que sejam protegidas algumas categorias, como o próprio Poder Público ou grandes grupos econômicos. “Recentemente, os comerciantes se viram obrigados, por imposição legal, a dispor, em cada estabelecimento, de um exemplar do Código de Defesa do Consumidor. O objetivo é justamente evitar que os direitos dos consumidores fiquem em segundo plano”.
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